ECOLALIA E AQUISIÇÃO DA LINGUAGEM EM CRIANÇAS AUTISTAS (p. 3)


PRINCÍPIOS GERAIS PARA O TRATAMENTO DA ECOLALIA

1. Proporcionar modelos alternativos à ecolalia , ajustar-se ao nível de desenvolvimento da criança.

2. Responda à intenção comunicativa da criança.

3. Adapte o input lingüístico ao nível de compreensão lingüística da criança.

4. Não se aproveite das habilidades especiais de memória episódica para treinar respostas excessivamente complexas ( ecos, “ camuflados”).

5. Adiar o treinamento de pronomes pessoais e em geral termino dêiticos até fases mais avançadas do programa.

6. Generalizar os objetivos alcançados em uma variedade de referentes , contextos e pessoas diferentes e fomentar a espontaneidade e o uso criativo de estruturas sintáticas.

7. Colocar o tratamento da ecolalia dentro do seu programa geral de tratamento da linguagem e comunicação.







1. Proporcionar modelos alternativos à ecolalia , ao ajustar-se ao nível de desenvolvimento da criança.



Os modelos devem estar ajustados ao nível de competência lingüística da criança; deste modo proporcionaremos uma emissão alternativa ao eco simplificada de maneira que a criança possa estabelecer as correspondências semântica-formais pertinentes ao modelo para um posterior uso flexível e criativo.

Suponha que uma criança ecolálica se situa diante de um adulto e sinalizando um pote de biscoito da cozinha lhe diz : Você quer um biscoito?. E o adulto imediatamente lhe deve dar um modelo verbal que possa ir desde “ biscoito”,”me dá biscoito” , “quero biscoito”... a níveis de complexidades superiores, em função do nível atual do sujeito.

Esta adaptação dos modelos requerem ter um conhecimento muito detalhado do nível real de habilidades lingüísticas da criança ( vocabulário, capacidades de categorização, habilidades morfossintáticas, etc).

Os modelos alternativos aos ecos devem dar-se isolados, com limites claros, sem verbalizações previas ou posteriores ao modelo. Deve ficar muito claro qual é o estimulo discriminativo. Não consideramos adequado o uso da contra- imitação ou repetição do eco da criança por parte do adulto. Em geral é adequado evitar perguntas Sim/Não de confirmação( p. exemplo:”Você que bombons?”, “ Não sabe?” etc) ou explicações de adiar o pedido( “depois eu te dou”).

A criança ecolalica geralmente tem dificuldades para iniciar interações e pode recorrer a provocar determinados diálogos rotina rios com o adulto que foram efetivos para a realização de um determinado objetivo, inclusive a vezes pode encontrar reforço na rotina de estas “correntes” de eco- modelo em base a seu interesse pelo perseverativos.



2. Responda à intenção comunicativa da criança.

Depois de que a criança está repetindo o padrão do adulto ( e é necessário que repita o modelo simplificado) o adulto garante o cumprimento do propósito da emissão; o exemplo dado se daria o biscoito pedido. De este modo a criança se dá conta do impacto de sua emissão.

De cara a evitar a formação de correntes de eco- modelo ou outras palavras para “desintoxicar” o modelo dado de eco precedente pode ser recomendável repetir um ou mais ensaios, da situação previa, instigando de maneira não verbal à repetição do modelo( no exemplo apresentaríamos outro pedaço de biscoito e esperaríamos ).

No exemplo dado da interpretação da intenção da criança era facilmente dedutível a partir do contudo do eco e do contexto em que se produziu ; em outros casos a interpretação requer a realização de uma analise funcional das condições antecedentes e conseqüentes ao mesmo e das funções pragmáticas subjacentes mediante a observação direta dos ecos no contexto em que se produzem, atendendo variáveis extralingüísticas com gestos , olhadas, orientação do corpo, objetos , pessoas e eventos da situação.



3. Adapte o input lingüístico ao nível de compreensão lingüística da criança.( Prinzant 1983b).

As crianças ecolálicas precisão de um input simplificado para identificar os elementos constituintes da fala , isolar as relações semântico- formal, adquirir competência lingüística e abandonar sua dependência episódica.

Schuler e Prizant (1985), apresentaram uma serie de slogans gerais para a simplificação do input lingüístico.

Paralelamente à simplificação da fala podemos treinar a criança a dizer “ não sei” ou “ não entendo” quando não compreendeu a emissão previa ( Schreibman e Carr, 1978).

O silencio e as interações não verbais são ferramentas muito adequadas em mãos do adulto se pretende evitar “hiperbombardear” a criança com verbalizações inecessárias.



Pautas gerais para a simplificação do input lingüístico

Prizant e Schuler, 1987)

1.Ajuste a complexidade da linguagem ao nível da criança.

a. Estrutura lingüística ( como falar)

b. Conteúdo da linguagem ( de que falar).

2. Evite falar excessivamente- fale com emissões claramente articuladas.

3.Consiga a atenção da criança antes de começar a falar.

a.Chame pelo seu nome.

b.Use instigação física se é necessário.



4.Fale de tópicos relevantes :

a. O que faz ou tenta fazer.

b. O que vai fazer

c. O que fez.

d.Acontecimentos familiares da criança.



5.Use repetições , redundâncias e paráfrases .

6.”Componha” e descomponha estruturas para ajudar a criança a aprender acerca da estrutura da linguagem.

a. Composição: “ Colocar papel. Papel no lixo. Colocar papel no lixo”.

b. Decomposição: “ Pega a colher e come o purê “ . “Pega a colher, colher( com indicação), pega purê , come purê”.

7. Se é possível relacione as emissões com objetos , aços e eventos do contexto mediante o uso de gestos , tocar e demonstração de ações .

8.Se é possível relacione a ecolalia com aspectos do entorno, simplificando-a e com demonstrações.

9 .Segmente claramente suas emissões usando o acento entonação e pausa.

10.Se a criança faz algo inadequado indique seu desacordo com uma voz baixa acompanhada de expressão facial. Não crie um espetáculo com volume, tom e expressão facial exageradas.

11.Se é necessário use gestos para dar um suporte a fala.

12. Faça que a criança saiba que você é um receptor motivado atendendo suas iniciativas comunicativas.

13 .Se uma criança não pode comunicar-se mediante fala ou sinais peça que mostre ou sinalize e proporcione as palavras correspondentes.

14.Se um pedido não pode ser satisfeito, responda simples e consistentemente ( p. exemplo: (“ Não tenho mais chocolate”).

15.Use a linguagem para ajudar a criança a antecipar eventos futuros, especialmente mudanças inesperadas de rotinas.

Nota: Estas pautas gerais são aplicáveis a fala, linguagem de sinais ou comunicação total.





4. Não se aproveite das habilidades especiais de memória episódica para treinar respostas excessivamente complexas( ecos camuflados).

Dada a habilidade das crianças ecolálicas para recuperar frases memorizadas sem nenhum tipo de analise das mesmas em base a sua memória a longo prazo caímos no perigo de treinar topografias de resposta aparentemente adequadas , muito desligadas da competência real da criança ( ecos” camuflados”) e aplicar para eles critérios de aquisição para continuar “ ascendendo” no programa de linguagem.

Os modelos que proporcionam a criança ecolálica para que se repita devem se preferivelmente completos ( modelo total verbal); devemos fazer um uso cuidadoso dos modelos verbais parciais p. exemplo”Que é isso”?... Ca... (carro)- como forma de facilitar a recuperação da palavra , já que parece não facilitar os processos de recuperação semântica.

As crianças ecolálicas associam de forma mecânica os modelos parciais e a palavra completa. No exemplo dado a criança contestaria dizendo”carro” a pergunta “ Que faz”? ...ca... ( caminha).

O exemplo excessivamente complexo e a sobreutilização de ajudas verbais parciais resultam reforço para as pessoas que rodeiam a criança ecolálica devido a que resultam muito efetivas para que a criança “fale” , se por falar entendemos acabar mecanicamente todas as frases que se indicam , sem qualquer sinal de compreensão.



5. Adiar o treinamento de pronomes pessoais e em geral termino dêiticos até fases mais avançadas do programa.



A aprendizagem dos denominados términos dêiticos ( pronomes pessoais , demonstrativos, tempos verbais, etc) constituem uma tarefa muito dificultosa para as crianças autistas, devido às mudanças dos referentes.

Em aberta contradição com o anteriormente dito alguns destes términos se treinam ou todavia pior se exigem de forma implica, isto é, sem formação previa, nas primeiras fases de muitos programas de ensino da linguagem, inclusive supostamente dirigidos a crianças de estes grupos.

Este seria o caso dos verbos reflexivos. Exigimos a criança a resposta p. exemplo.” Se seca” em resposta a pergunta” Que faz”? para o rotulado da ação de um companheiro: “ “me seco” em resposta à mesma pergunta sendo a própria criança o ator da ação e usamos “ te seca” quando é o terapeuta quem ordena a essa ação.

Idêntico fenômeno acontece com o contraste entre a primeira , segunda e terceira pessoa do singular do presente do indicativo; e o contraste entre o uso de “relações + gerúndio”( p. Exe. “ está comendo”) e o presente do indicativo( “ come” ).

Se a dificuldade derivada de esta continua mudança de referentes le agregamos o fato de que aparecem em sua maioria acompanhados de verbos podemos concluir que o uso de esses terminos supoe um incremento muito significativo de nivel de dificuldade na aprendizagem dos verbos.

6. Generalizar os objetivos alcançados em uma variedade de referentes , contextos e pessoas diferentes e fomentar a espontaneidade e o uso criativo de estruturas sintáticas.

Dada a sobredependencia das crianças ecolálicas da memoria episodica caimos no perigo de treinar condutas verbais aparentemente adequadas em base a claves visuais ou auditivas muito sutis, nao tao aparentes, mas que continuam sendo respostas mecanicas.

É necessário portanto, no marco de um modelo de tratamento da comunicação assegurar a criação dos objetivos a referentes, pessoas e situações diferentes (Gortázar e Tamarit, 1989).

7.Colocar o tratamento da ecolalia dentro do seu programa geral de tratamento da linguagem e comunicação.

Na hora de planear o treinamento de estruturas sintáticas em sujeitos ecolálicos devemos partir de seus níveis atuais de produção espontânea e criativa. Por exemplo, se a criança usa na sua linguagem espontânea verbos isolados( p, exem. “ come”, “ abre”) para o rotulado de ações , nos planejaremos como objetivo de treino p. exem. estruturas do tipoVerbo+C.D. (“come batatas”, etc) a margem de que a criança produza ecos de 4 ou 5 elementos.

Nos asseguraremos previamente que a criança conheça um dos referentes , dos elementos da frase a treinar ( assim evitaremos criar “ ecos camuflados” ) e iremos construindo analiticamente elo por elo frases cada vez mais complexas.

Uma vez decidido qual vai ser o objetivo e selecionado os exemplos concretos a treinar a seguinte questão a levantar é, que técnica de treinamento sintático pode ser mais adequada? Posso fundamentar o treinamento nas chamadas técnicas de imitação (Crystal e outros, 1983), segundo os quais se requer a repetição por parte da criança do modelo do terapeuta.

Em base a considerações anteriores sobre o uso da memória episódica em sujeitos ecolálicos, o uso de esta técnica seria completamente contraproducente. Em minha experiência clinica constatei que mesmo sendo provável que a criança conheça e discrimine cada elemento isolado da oração o fato de que lhe proporcionemos uma frase como input determina sua armazenagem global em forma de eco sem descodificação semântica.

Posso usar também as denominadas técnicas de incrementação ou indução (Crystal e outros, 1983), nas que o terapeuta pede a criança que complete ou repita inteira uma oração começada por ele.

Segundo nosso ponto de vista esta técnica pode ser útil só como modelo de indução a primeira palavra da frase, sempre que se exija uma repetição, não terminação, e se emprega em combinação com outras técnicas.

Uma alternativa mais útil para o treinamento sintático de crianças ecolálicas são as denominadas técnicas de substituição (Crystal e outros, 1983). Consiste na apresentação de uma oração estimulo para que a criança repita substituindo um ou mais elementos.



Conclusões.

O descobrimento de uma diversidade de inter-relações entre a ecolalia e o desenvolvimento lingüístico e comunicativo determinaram um revisão dos modelos teóricos sobre a natureza da ecolalia, que já não pode ser considerada como uma patologia em si mesma , mas como o resultado de uma inter-relação de vários fatores ( modelo multifatorial).

Com base ao anterior será necessário programar o tratamento da ecolalia em base ao nível lingüístico e comunicativo da criança e marcar dita programação dentro do programa de tratamento da linguagem e comunicação.

Deveremos adaptar os modelos curriculares existentes às particularidades dos sujeitos ecolálicos de tal forma que incrementaremos as habilidades do sujeito para segmentar a fala em suas constituintes, identificar e diferenciar as palavras conteúdas (nomes , verbos etc.) e abstrair estruturas sintáticas.


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