ECOLALIA E AQUISIÇÃO DA LINGUAGEM EM CRIANÇAS AUTISTAS(p.2)
Modelo de aquisição da linguagem em crianças autistas ( Prinzant, 1983ª)
Prinzant(1983ª) , fundamentando-se no conceito do continuo processamento gestalt- analitico propõe um modelo de aquisição da linguagem para descrever o progresso do desenvolvimento da linguagem em crianças autistas.
Fica claro que este modelo de desenvolvimento se apresenta em etapas só de cara à claridade da exposição. O processo se compreende melhor como um continuo sem divisões claras.
Na primeira etapa as emissões são principalmente ecolálicas e o nível de compreensão é muito baixo.
O sujeito usa ecos com função interativa de toma de turnos ( função fática), ecos de recheio para o manutenção da interação sem função comunicativa concreta. Também se observam ecos com função de auto-estimulação.
Na segunda etapa se produz uma diversificação das funções pragmáticas cujo serviço vai estar a ecolalia. ( Vease Prinzant e Rydell, 1984; Prinzant e Duchan, 1981 para um estudo das diferentes funções da ecolalia imediata e demorada).
O desenvolvimento social-cognitivo da criança , os progressos nas capacidades de compreensão das situações sociais, determinam uma maior sutileza nas associações que dão origem à ecolalia o que determina um diversificação dos propósitos ou funções da ecolalia.
Mas inversamente, o uso durante a primeira etapa da ecolalia sem funções comunicativas ( ecolalia com função fática e de auto-estimulação)pode permitir à criança autista , por um modelo operante , adquirir noções das conseqüências de suas emissões no meio, noções acerca dos fins que se podem conseguir através da linguagem.
Vemos por tanto como incluso as formas mais automáticas de ecolalia podem desempenhar um papel na aquisição da linguagem.
No fim de esta etapa a criança pode começar a aplicar e adquirir estratégias para descompor as emissões ecolarizadas incluindo em determinados ecos fragmentos de outros ou de palavras ( coisa que denominamos ecolalia mitigada) que seria um primeiro indicador de flexibilidade e aquisição de regras lingüísticas. Em alguns casos se produz uma aquisição de palavras isoladas coexistindo com a mitigação de ecos.
Os processos de mitigação ( “ecos telegráficos “ , ajustes pronominais e composições de diferentes ecos , entre outros ) constituem por tanto um via de acesso à aquisição da linguagem nas crianças autistas ( Baltaxe e Simmons, 1977) , e outorgam à ecolalia um papel importante no desenvolvimento lingüístico e cognitivo da criança. Fay e Butler ( 1968) encontraram que as crianças ecolálicas cujas emissões são predominantemente mitigadas tem pontuações de C.I. mais altas e melhor execução lingüística que aqueles cuja ecolalia é predominantemente exata.
Roberts, 1989 , mediante um estudo de amostras de linguagem espontânea de 10 crianças ecolálicas acompanhado de uma avaliação de suas habilidades receptivas encontrou uma relação inversa entre habilidades de compreensão e a proporção de ecolalia mitigada.
Seguindo a Prizant (1983ª) , aquelas crianças que não avançam alem das etapas 1 e 2 representam o grupo de autistas de mais baixo funcionamento e permanecem ecolálicos durante grandes períodos de tempo.
A terceira etapa implica a aquisição de formas lingüísticas cada vez mais criativas e flexíveis seja via complexidade da linguagem espontânea ou via progressos na analises e segmentação dos ecos , cujo resultado será a diminuição da ecolalia com incremento concomitante da linguagem espontânea.
Durante a terceira etapa terá um momento na qual algumas funções comunicativas serão expressadas tanto por emissões espontâneas como ecolálicas.
Wetherby,1986 em uma revisão de estudos sobre o desenvolvimento da linguagem no autismo desde uma aproximação pragmática comenta que o desenvolvimento de cada uma das funções pragmáticas em sujeitos autistas sempre passa do uso ritualizado (ecolalia, uso vinculado a um contexto) a emissões flexíveis.
Na quarta etapa a criança adquire linguagem mais espontâneo e flexível, refletindo um conhecimento crescente das regras semânticas –sintáticas e morfológicas.
A ecolalia já não é usada como funções cognitivas ( exemplo: auto-regulação, rejeição), já que a criança chegou a ser capaz de internalizar operações para o processamento da linguagem e a regulação de sua própria conduta.
As funções comunicativas são expressadas nesta fase principalmente por emissões espontâneas e criativas.
De qualquer forma podem aparecer vestígios de conduta ecolálica durante estados de fadiga, confusão ou distração. (Simmons e Baltaxe, 1975).
Ocasionalmente a ecolalia não funcional persiste mesmo que o sujeito tenha adquirido um conhecimento mais avançado da estrutura da linguagem . Com nisso Schuler e Prinzant, 1985 afirmam que a persistência da conduta ecolálica não pode ser totalmente explicada pela existência de habilidades de compreensão ou expressão limitadas.
Embora o resultado final , ou seja , a linguagem espontânea , é o mesmo que em um modelo de desenvolvimento normal da linguagem , claramente a criança ecolálica apresenta etapas e estratégias de aquisição da linguagem que diferem daquelas observadas em uma criança normal.
Seguindo a Prinzant, 1983 b, o sistema de processamento gestaltico não parece ser apropriado nem suficiente para as demandas analíticas das interações comunicativas . Em palavras de Prinzant.
“A comunicação efetiva, dependente do continuo ajuste e modificação do discurso, somente pode ser conseguida através de um processo de analise da interação , em outras palavras, de um processo analítico.
Um estilo de processamento extremadamente gestáltico pode explicar a falta de habilidade em crianças ecolálicas para fazer frente às mudanças imprevisíveis , adquirir habilidades sociais sutis e adquirir um sistema de linguagem flexível e geradora” .
(Prizant, 1983,b, 69).
Mc Evoy, Loveland e Landry en 1988 e de acordo ao modelo de Prinzant levantaram as seguintes hipóteses :
1.A freqüência relativa da ecolalia na linguagem espontânea , ou seja, a proporção da ecolalia na linguagem espontânea variará de acordo com o nível do desenvolvimento lingüístico seguindo um modelo lineal ; diminuindo a freqüência relativa da ecolalia a medida que melhora o nível lingüístico. A criança ecolálica com um baixo nível de desenvolvimento da linguagem produz poucas emissões porém um porcentagem alto das mesmas são ecolálicas já que carece de habilidades para produzir suas próprias emissões . Como falávamos anteriormente a aquisição de formas lingüísticas cada vez mais criativas e flexíveis seja via complexidade da linguagem espontânea ou via progressos de mitigação vai ter como resultado a diminuição da freqüência relativa da ecolalia com um incremento da linguagem espontânea . Segundo Schuler (1979) a ecolalia em geral apresenta associada a níveis baixos de compreensão lingüística. Os sujeitos ecolálicos tendem a ecolarizar frases que não são compreendidas (Durand, 1987; Fay, 1975). A ecolalia raramente se produz com compreensão da mensagem (Fay, 1967, 1969), e quando o sujeito possui alternativas de respostas adequadas (Carr, Schreibman e Lovaas, 1975). Existe evidencia de que a ecolalia desaparece quando emerge a competência lingüística (Fay y Butler,
1968 ).
Howlin, 1982, em um estudo transversal de 26 crianças autistas divididos em três grupos de acordo com o nível de desenvolvimento lingüístico, encontrou que a freqüência relativa de emissões ecolálicas diminuía a medida que se incrementava o nível lingüístico( medido através de L.M.E. e analises do tipo morfemas e regras de transformacionais) .
2. A freqüência absoluta de ocorrência da ecolalia em crianças autistas muito provavelmente varia de acordo com o nível de aquisição da linguagem, porém não é de forma linear. É provável que as relações entre freqüência absoluta de ecolalia e nível de desenvolvimento lingüístico se expressem melhor segundo um modelo curvo de U invertida já que tanto as crianças com níveis de linguagem baixos como altos apresentam absoluta ecolalia.
As crianças com baixo níveis de habilidades lingüísticas produzirão baixos níveis de freqüência absoluta de ecolalia e de fala espontânea.
As crianças com mais altos níveis de linguagem produzirão muito pouco ecolalia em términos absolutos e relativos devido a que possuem habilidades alternativas com as quais comunicar-se.
As crianças com um nível de linguagem intermédio apresentarão uma frequencia absoluta de ecolalia maior já que lhes serve como um meio de comunicação e de um posterior desenvolvimento da linguagem.
3. De acordo co a hipóteses de Prinzant sobre o desenvolvimento da ecolalia o numero de funções pragmáticas expressadas através da ecolalia seguirão o modelo curvo de U invertida já que , com base ao anteriormente exposto tanto as crianças com níveis de linguagem baixos como altos comunicam-se com um repertorio limitado de funções pragmáticas através da ecolalia.
As crianças autistas com um nível intermediário de habilidades lingüísticas são as que expressarão através da ecolalia um maior numero de funções.
Mc Envoy, Loveland e Landry contrastaram esta hipóteses com 18 crianças autistas ( remitimos ao citado trabalho para os detalhes sobre a amostra, etc) recolhendo dados de freqüência de ecolalia imediata , porcentagem de ecolalia imediata, funções da ecolalia, idade cronológica , idade não verbal e nível de desenvolvimento da linguagem.
Os resultados, como indicam os próprios autores estão muito mediados pela natureza transversal do estudo.
Para conseguir determinar o padrão da evolução da ecolalia em crianças autistas não é necessário realizar estudos longitudinais.
A idade de compreensão e expressão lingüística e a idade não verbal eram preceptores significativos do porcentagem da ecolalia. A idade de expressão lingüística era a única variável que predizia significativamente a freqüência da ecolalia. Não encontramos relações significativas entre o numero de funções expressadas por meio da ecolalia.
Implicações
Em base às questões levantadas nas paginas anteriores em quanto à natureza do desenvolvimento da ecolalia podemos levantar uma serie de princípios gerais de intervenção.
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